Avanços na aplicação de nanopartículas e nanofios de ZnO em dispositivos piezoelétricos

Juliano José Dias Barbosa Ribas,*

Nos últimos anos, a busca por fontes de energia limpa e sustentável tem ganhado destaque no meio científico e tecnológico devido à necessidade explícita de cuidado com o nosso planeta. Graças ao alto engajamento de pesquisas na área, existe uma perspectiva otimista de resposta para tais problemas durante os próximos anos. Nesse contexto, surgem à tona algumas possibilidades de resolução por meio de tecnologias promissoras.

Materiais denominados inteligentes, ou “smart materials”, são substâncias que reagem a estímulos externos com bom grau de controle sobre suas propriedades, sendo utilizados em sensores e dispositivos cujas características são ditadas pela aplicação de campo elétrico, magnético ou tensão mecânica [1]. O campo de pesquisa em materiais vem crescendo cada vez mais, possibilitando uma gama maior de usos para determinadas propriedades, como em materiais magnetorreológicos. Normalmente, são usados na forma de fluido, que, ao interagir com um campo magnético, tem suas propriedades alteradas e o material ganha a capacidade de mudar do estado líquido para o semissólido após poucos milissegundos, similar a um fluido não newtoniano [2]. Com isso, surgem ideias promissoras no âmbito de energias para esses materiais, no intuito de produção de energia a partir de dispositivos com menor impacto ao ambiente, isto é, de maneira sustentável e limpa.

Uma das formas mais promissoras é a energia baseada em vibrações mecânicas, como o movimento de máquinas e veículos. Para tal, são aplicados materiais piezoelétricos, os quais convertem energia mecânica em elétrica. Há um grande interesse em estudá-los, em especial o óxido de zinco (ZnO) nas formas de nanopartículas e nanofios, pois, quando nessa escala, além de ser um semicondutor, ocorre um confinamento de elétrons em seu interior, acentuando suas propriedades elétricas, ópticas e magnéticas. Outra razão para a escolha do ZnO se dá por ser um material abundante e de baixo custo, podendo ser facilmente sintetizado.

Este artigo revisa como sintetizar nanopartículas de ZnO e suas aplicações em dispositivos piezoelétricos coletores de energia.

Dispositivos Piezoelétricos

Com o avanço tecnológico atual, diversos dispositivos e tecnologias ganharam visibilidade devido às suas aplicações e capacidades. Uma dessas tecnologias são os chamados Dispositivos Piezoelétricos, do grego “piezen”, que significa pressionar, os quais são baseados na conversão de energia mecânica em energia elétrica por meio da utilização de sensores de vibração piezoelétricos. De modo geral, o funcionamento dos sensores se dá colocando um material cristalino piezoelétrico entre duas placas metálicas não carregadas, as quais irão pressionar o material, gerando estresse mecânico e assim forçando o desequilíbrio das cargas elétricas internas, que se deslocam em lados opostos do material para finalmente serem coletadas pelas placas metálicas onde, agora eletrizadas, irão transportar corrente elétrica através de circuitos para sua utilização [3].

Dispositivos piezoelétricos baseados em ZnO já estão sendo testados e utilizados em diversas aplicações, desde calçados inteligentes capazes de coletar energia dos passos para carregar dispositivos eletrônicos portáteis, até dispositivos biomédicos, como sensores de tensão muscular ou de atividade respiratória. Outra aplicação interessante e promissora é em sensores autossustentáveis que não necessitam de bateria, pois coletam energia do ambiente. Além de tudo isso, esses dispositivos podem ser acoplados em estruturas de pontes ou edifícios para fazer o monitoramento de vibrações e detecção de possíveis falhas nas estruturas.

Nanoestruturas de ZnO

Nanopartículas de ZnO

Nanopartículas de ZnO são partículas extremamente pequenas, com tamanhos na escala de 1 nanômetro, tendo como características visuais a de um pó fino e branco após sua produção. O óxido de zinco possui um band gap teórico de 3,37 eV (elétron-volt), grande energia de ligação de excítons e uma boa mobilidade eletrônica, o que ajuda na obtenção de atividades ópticas, elétricas e mecânicas. O ZnO apresenta normalmente uma estrutura cristalina hexagonal denominada “wurtzita”, constituída por íons de zinco e oxigênio numa disposição tetraédrica [4].

Quando nanopartículas de ZnO são incorporadas em dispositivos piezoelétricos, elas aumentam a eficiência de conversão de energia mecânica em elétrica, pois as nanopartículas apresentam grande área superficial em relação ao seu volume, o que permite uma maior interação com as forças mecânicas aplicadas. Além disso, elas podem ser dispersas em polímeros ou outros materiais para criar compósitos flexíveis e de alta performance.

Figura 1: Estrutura cristalina de ZnO na forma de wurtzita[5]

Nanofios de ZnO

Os nanofios de ZnO são estruturas alongadas, similares a pequenos fios, com diâmetro em escala nanométrica. Eles são especialmente interessantes para dispositivos piezoelétricos porque têm a propriedade de se alinharem em arranjos ordenados, aumentando assim a eficiência da coleta de energia.

Quando submetidos a uma força mecânica, os nanofios se deformam e geram uma tensão elétrica ao longo de seu comprimento. Essa propriedade os torna ideais para aplicações em sensores e coletores de energia em microescala, como os “wearables”, dispositivos eletrônicos que podem ser usados ou incorporados no vestuário para auxiliar nossas vidas, fazendo o monitoramento de glicose no sangue, padrões de sono, batimentos cardíacos, entre outros.

Normalmente, a estrutura cristalina de nanofios de ZnO segue similar às nanopartículas, resultando na estrutura de “wurtzita” [6].

Métodos de Síntese de Nanoestruturas de ZnO

Síntese de Nanopartículas

Para sintetizar nanopartículas de ZnO, existem alguns métodos conhecidos os quais demandam diferentes rotas ou materiais. Este artigo irá dar enfoque em um dos métodos mais utilizados e com menor custo para ser realizado, denominado Sol-Gel.

Sol-gel é uma rota de síntese na qual ocorre transição do sistema sol (colóide cuja fase dispersa é sólida e a dispersante é líquida) para um sistema gel (sólido com consistência gelatinosa). Os géis conseguem ter sua espessura e algumas propriedades bem controladas a partir de processos químicos que hidrolisam os compostos da mistura em sistema sol. Posteriormente, o sistema gel passa por um processo de tratamento térmico visando a eliminação de resíduos orgânicos no sistema, além da formação de fato das nanopartículas de ZnO e sua passagem de um gel para cristais em pó, os quais apresentam coloração branca [7].

O passo a passo do método se dá da seguinte forma: deve-se colocar água destilada para aquecimento em um agitador magnético junto de 5 a 10% de um estabilizador (por exemplo, monoetilenoglicol) por volta de 60°C a 80°C, formando uma solução aquosa. Em seguida, deve ser adicionado acetato ou nitrato de zinco, mantido em agitação por cerca de uma hora, quando será adicionado álcool na amostra e, ao resfriar, colocado então no processo denominado tratamento térmico. Este processo consiste em deixar a amostra numa estufa por um determinado período de tempo para que todo o álcool seja evaporado e, posteriormente, num forno elétrico, serão eliminados resíduos orgânicos, como o carbono.

Para ajustar o pH desejado da amostra, no início dos procedimentos, deve-se adicionar à solução aquosa alguma substância capaz de aumentar ou diminuir o pH, como por exemplo o ácido cítrico, utilizado para diminuir o pH, ou o hidróxido de sódio (NaOH), usado para aumentar o pH [8].

Nanoestrutura de ZnO com Dopagem

Para os casos nos quais há dopagem de outro material na estrutura de ZnO, normalmente são usados compostos com número atômico próximo ao do zinco, como níquel (Ni) e cobre (Cu), processo realizado no intuito de modificar certas propriedades das nanopartículas de maneira a minimizar distorções estruturais, dependendo da aplicação desejada. Um exemplo de modificação se dá em propriedades ópticas, podendo haver ajuste do band gap do ZnO, em aplicações de fotocatálise e optoeletrônica. Outra propriedade interessante obtida com a dopagem é a de que alguns dopantes são capazes de melhorar a resistência à degradação térmica ou química do ZnO, tornando-o assim mais propício para aplicações em ambientes extremos.

Quando se deseja dopar a estrutura do ZnO, deve-se acrescentar o material de escolha no início do processo de síntese, junto na adição de acetato ou nitrato de zinco. Ao fim do processo, íons Zn da estrutura hexagonal de ZnO serão substituídos pelo íon dopador.

Síntese de Nanofios

Para preparar nanofios de ZnO, existem algumas formas comumente usadas, como o próprio Sol-Gel. Entretanto, esse artigo irá abordar apenas um método também muito prático e eficaz.

O método em questão é o denominado Oxidação Térmica, o qual possui baixo custo para ser realizado, é um processo rápido e possibilita um bom controle das nanoestruturas [9]. Para realização do processo, uma folha ou fio do material desejado (no caso, Zn) será aquecida entre 400° a 700°C (temperatura onde se obtém nanofios) por cerca de 4 horas em algum ambiente com oxigênio disponível, o qual irá se difundir na folha de zinco, formando assim os nanofios de ZnO a depender das condições de não equilíbrio da oxidação. Para controlar o diâmetro das nanoestruturas, comprimento e morfologia, basta regular a temperatura e o tempo de aquecimento desejado [10].

Conclusão

Este trabalho teve o intuito de apresentar o que são dispositivos piezoelétricos, os quais têm ganhado notoriedade no mundo tecnológico devido às suas aplicações de vasto interesse, em especial na produção de energia limpa através de processos de conversão de energia mecânica em energia elétrica. O material escolhido para ser abordado como componente chave de dispositivos piezoelétricos foi o óxido de Zinco (ZnO) em suas versões nanoestruturadas, especificamente nanopartículas e nanofios de ZnO.

Para melhor entendimento, foram demonstrados os processos de obtenção das nanoestruturas mencionadas, por método de Sol-gel para nanopartículas, processo simples, de baixo custo e bastante eficaz, e o método de Oxidação Térmica, cuja principal vantagem é a rapidez de produção. Com isso, cria-se uma projeção futura de um mundo com menos produção de poluentes e substâncias nocivas ao planeta, graças ao desenvolvimento de novas tecnologias sustentáveis.

REFERÊNCIAS

[1] “‘Smart materials’, descubra os materiais com os quais moldaremos o futuro”. Em: Iberdrola (2022). doi: https://www.iberdrola.com/inovacao/materiais-inteligentes-aplicacoesexemplos.

[2] Barbosa, Karine Fortunato Silva. “Uma abordagem dos Fluidos Magneto-Reológicos e suas aplicações tecnológicas e o mercado mundial”. Em: Research, Society and Development (2024). doi: http://dx.doi.org/10.33448/rsd-v13i6.46107.

[3] “Sensores de Vibração Piezoelétricos: o que são e como funcionam”. Em: Pacifico (2023). doi: https://pacifico.com/sensores-de-vibracaopiezoeletricos-o-que-sao-e-como-funcionam/

[4] Mayrinck, C.; Raphael, E.; Ferrari, J. L.; Schiavon, M. A. “Síntese, Propriedades e Aplicações de Óxido de Zinco Nanoestruturado”. Em: Revista Virtual de Química 41.1 (2014), p. 20180153. doi: http://dx.doi.org/10.5935/1984-6835.20140078.

[5] “Design and tailoring of one-dimensional ZnO nanomaterials for photocatalytic degradation of organic dyes: a review”. Em: ResearchGate (2019). doi: https://link.springer.com/article/10.1007/s11164-018-03729-5.

[6] Oliveira, João Wagner Lopes de. “Síntese e caracterização de nanofios de ZnO para aplicações em emissão de campo”. Em: Repositório Digital LUME; Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2010). doi: http://hdl.handle.net/10183/70355.

[7] Freitas, Marianne Roque De. “Síntese e Caracterização de Nanopartículas de ZnO Dopado e Codopado Com Metais de Transição”. Em: Acervo digital da UFPR (2018). doi: https://hdl.handle.net/1884/69956.

[8] Bayerl, Vanessa. “Efeito da Mudança de Parâmetros de Síntese de Nanopartículas de Óxido de Zinco”. Em: (2024).

[9] Campos, Alex da Cunha. “Caracterização de Nanofios de ZnO Sintetizados pelo Método de Oxidação Térmica”. Em: Biblioteca Digital de Monografias da UFPA (2019). doi: https://bdm.ufpa.br/jspui/handle/prefix/2534.

[10] Malwal, Deepika; Packirisamy, Gopinath. “Recent Advances in the Synthesis of Metal Oxide (MO) Nanostructures”. Em: ScienceDirect (2018). doi: https://doi.org/10.1016/B978-0-08-101975-7.00010-5.

Autor:

Juliano José Dias Barbosa Ribas, bolsista do NAPI EZC. Sob a orientação do Prof. Dr. Guilherme Jean Pereira de Abreu.

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